Um estudo publicado na revista científica Acta Tropica identificou que áreas da Amazônia com cerca de 50% de desmatamento próximo a locais de moradia apresentam maior risco de transmissão de malária, tanto pelo aumento de casos em humanos quanto pelas taxas de infecção de mosquitos do gênero Anopheles. A pesquisa, realizada em 40 pontos de Cruzeiro do Sul, no Acre, e em outras cidades do Vale do Juruá, mostra que a fragmentação da vegetação favorece o contato entre vetores e moradores, perpetuando ciclos endêmicos na região.
Segundo o biólogo Gabriel Laporta, autor correspondente do artigo, o risco é maior quando há equilíbrio entre áreas desmatadas e floresta remanescente. “Detectamos que o maior risco de transmissão ocorre quando há uma proporção de 50% de mata nativa próxima a assentamentos ou núcleos populacionais. O risco diminui se o desmatamento é completo, tornando o ambiente inóspito para o vetor, ou quando a floresta é restaurada para níveis acima de 70%, mostrando a importância da conservação e da restauração”, afirmou.
O trabalho integra um projeto que busca compreender os ciclos persistentes de doenças como malária, doença de Chagas e leishmaniose cutânea em áreas de desmatamento, combinando geoprocessamento, sensoriamento remoto e análise de incidência de parasitas humanos. A iniciativa tem duração prevista de cinco anos, com término em 2027. No Brasil, a malária é endêmica nos nove estados da Amazônia Legal, que concentraram 138 mil dos 142 mil casos registrados em 2024, segundo o Ministério da Saúde. O país assumiu a meta de reduzir para menos de 14 mil casos até 2030 e eliminar a doença até 2035.
Além do desmatamento, os pesquisadores destacam fatores como perda de biodiversidade, grandes projetos de infraestrutura e mudanças climáticas como agravantes do cenário. “As questões ambientais e de saúde pública parecem distantes, mas estão muito conectadas. O pagamento por serviços ecossistêmicos, por meio do mercado de carbono, pode ser uma alternativa. Uma conferência como a COP30 pode ser uma oportunidade para discutir como iremos substituir o modus operandi de hoje”, declarou Laporta.
A Organização Mundial da Saúde estima que, em 2023, houve 263 milhões de casos de malária no mundo, com 597 mil mortes, 95% delas na África. No Brasil, a prevenção individual é feita com uso de mosquiteiros, telas e repelentes, enquanto medidas coletivas incluem saneamento, eliminação de criadouros e melhorias nas condições de moradia. Para os autores, combinar conservação florestal e estratégias de controle de vetores é essencial para reduzir o risco de transmissão e avançar na eliminação da doença.